"Vim somente para trazer presentes para as crianças
e alegria para uma cidade sombria em uma época sombria"
e alegria para uma cidade sombria em uma época sombria"
Klaus
Apesar de eu ser cristão, por muito tempo não gostei do Natal. De uns anos para cá, contudo, graças a um texto de C.S. Lewis passei a resignificar as tradições desta época do ano dentro de mim. A última delas, que ainda me causava resistência, era o Papai Noel. Essa figura fantasiosa que tenta usurpar o trono do Messias como figura principal do Natal me parecia só isso mesmo: Uma ficção capitalista que desvia a atenção do significado maior da data e impulsiona a compra e venda de produtos no final do ano.
Eu não esperava mudar de opinião, mas mudei (Pelo menos quanto ao interesse no personagem e em seu valor simbólico). E muito menos esperava que o responsável por essa mudança fosse um escritor como o escocês Grant Morrison, que, seguindo a linha do famoso Rei escocês James VI e I que mandou traduzir a Bíblia, costuma transitar entre o sagrado e o profano e é muitas vezes chamado de ocultista. Em 2015, Morrison se juntou à editora Boom Studios e ao artista Dan Mora para contar "A maior de todas as histórias jamais contadas", segundo ele, na série de Graphic Novels Klaus, Como Surgiu o Papai Noel e que se tornou para mim a origem definitiva do personagem e a melhor forma de encará-lo. Esta é a história do Papai Noel que vou contar para o meu filho:
Era uma vez, nas distantes terras do norte do mundo, uma
mulher que morreu congelada protegendo
seu bebê do frio. Dois homens da cidade
de Grimsvig, Karl e Alrik encontraram o bebê vivo nos braços da mãe e o levaram
para ser criado com seu povo. “À medida em que os anos passaram, a história de
que a criança fora salva por causa do calor em seu coração cresceu e eles o
chamaram de Klaus, cujo significado é ‘Vitória do Povo’”em sua língua nativa.
Klaus desenvolveu um grande afeto por Dagmar, a filha de Alrik, que aliás, não
era um homem qualquer, mas o Barão de Grimsvig, governante da cidade, que
reportava-se diretamente ao rei do país.
Klaus tinha o dom de esculpir brinquedos na madeira e costumeiramente
presenteava Dagmar com eles. Os dois cresceram juntos como grandes amigos, mas
havia um outro garoto na cidade, chamado Magnus, que sentia muito ciúme dessa
amizade.
Anos depois “os lobos estavam
ferozes nos arredores da cidade. Porém, ainda mais feroz era Klaus, o jovem
capitão da guarda de Grimsvig, escolhido a dedo pelo Barão Alrik”. Em um dia de
patrulha e caça aos lobos, Klaus encontrou uma filhote de lobo cuja vida
decidiu preservar sem que sua tropa o soubesse. Ele a chamou de Lilli. Na mesma
época a esposa de Alrik havia falecido e Magnus se tornara conselheiro do
Barão. Enciumado e desejando tanto a filha quanto o poder de seu senhor, Magnus
envenenou o vinho do Barão que segundo ele era “a única coisa que mantém o
senhor vivo desde a morte de sua adorada
esposa”. Com o barão morto, Magnus acusou quem quis e seu alvo não poderia ser
diferente: Klaus foi expulso da cidade para viver sozinho na neve, condenado
como assassino do Barão de Grimsvig.
Ele teria morrido no gelo, não fosse
pela ajuda de Lilli que, enviada pelos espíritos do gelo e da floresta o
resgatou como forma de gratidão ao ex-capitão da guarda. Nos anos que passou
vivendo no ermo gelado na companhia de sua loba, Klaus aprendeu a sobreviver
com o uso da magia da floresta.
Muitos anos mais tarde, Klaus
decidiu voltar à cidade e encontrou uma Grimsvig muito diferente. Além dos
guardas e do taverneiro, notou que não havia homens na cidade. Logo descobriu
que todos eles estavam trabalhando nas minas por ordem do Barão de Grimsvig,
Lorde Magnus que havia se casado com Lady Dagmar e assumido o poder!! Dentre os
desmandos de Magnus, Klaus descobriu também que ele havia decretado que toda
diversão pública estava proibida e que todos os brinquedos deveriam ser
recolhidos e dados a seu próprio filho, Jonas, uma criança mimada que o Barão
alegava ser portador de uma doença que não lhe permitia sair do castelo.
Indignado com a forma com que os guardas tratavam as crianças que brincavam na
rua, Klaus arranjou uma briga com eles e foi expulso novamente da cidade depois
de ser bastante machucado por eles.
Na floresta junto à Lilli, Klaus
tocou sua flauta mágica enquanto lamentava a situação injusta e cruel pela qual
as crianças de Grimsvig passavam, tendo inclusive seu Festival de Inverno, o
Yuletime, cancelado. Quando a música encheu a clareira onde Klaus e Lilli
acampavam, os espíritos do gelo se manifestaram e dançaram com eles pela noite.
Klaus pediu-lhes orientaçãoo sobre como ajudar aquelas crianças e adormeceu.
Quando acordou no dia seguinte, ele estava cercado por dezenas de brinquedos
dos mais variados tipos! Logo ele soube o que deveria fazer: Entregá-los às
crianças! Corajosa e ousadamente, Klaus escalou as muralhas da cidade durante a
madrugada e no dia seguinte as crianças camponesas acordaram com presentes em
suas casas: Brinquedos mágicos!
Isso acendeu a ira de Lorde Magnus
que confiscou todos os brinquedos para dá-los a seu filho Jonas. Ele também
ordenou ao guardas que encontrassem quem era o “descontente entre nós (...) que
se recusa a jogar de acordo com as regras da civilização”. As crianças e o povo
da cidade começaram a acreditar que fora um espírito do Yuletime, um Julernisse,
que trazia os presentes.
A guarda continuava sua busca pelo
rebelde que estava trazendo presentes às crianças e esperança a todo o povo e
ao mesmo tempo diminuindo o medo e o poder de lorde Magnus sobre eles. O Barão
por sua vez estava desesperado e foi cobrar seu padroeiro sobrenatural, a real
razão por trás do trabalho excessivo imposto aos homens que trabalhavam nas
minas de Grimsvig. Abaixo das minas, estava presa uma criatura demoníaca que
odiava a alegria e que ajudara Magnus a tomar e manter o poder pelos últimos
anos. Seu nome era Krampus e ele prometia ao Barão que tão logo fosse
completamente libertado garantiria perpetuar Magnus e sua linhagem no poder
para sempre.
Enquanto isso, Klaus consegui se
encontrar secretamente com Lady Dagmar e devolver-lhe a esperança em dias
melhores. Ela, então, começou a influenciar seu filho mimado, Jonas, a melhorar
sua atitude. Klaus também se encontrou com o velho Karl que, junto com Alrik, o
havia encontrado na floresta de gelo ainda bebê. Karl ainda trabalhava como
membro da guarda da cidade e Klaus prometeu-lhe, em nome dos espíritos do gelo
e da floresta, resgatar o significado de sua farda dando uma Festa de Yuletime
como não se via há muito tempo. “E todos
estão convidados” disse Klaus.
Depois de convocar os mineiros para
sua festa, Klaus foi atender o pedido de
uma carta. Contudo, quando chegou ao local, descobriu que tinha caído em uma
armadilha preparada pelo Barão Magnus. Ele tentou fugir correndo por toda a cidade
murada, mas os guardas estavam todos preparados para enfrentar o lobo-fantasma
que entregava presentes com o objetivo de promover uma rebelião contra a
tirania. Ferido quase mortalmente, Klaus conseguiu se esconder por um tempo e foi
salvo por um menino, filho do antigo taverneiro. O garoto conseguiu conduzir
Klaus para além da muralha e chegou à floresta, onde encontrou Lilli. Klaus
chegou à sua casa arrastado pela loba assessorada pelo menino e teve apenas
tempo de tomar algumas poções curativas, por que logo em seguida sua casa foi
cercada por Magnus e seus homens. Eles
feriram sua loba com flechas, amarraram-no no chão de gelo, queimaram sua casa
e levaram o menino.
Diante da situação de Grimsvig, a
cidade próxima de Bjorn resolveu intervir para depor o Barão Magnus e mandou
uma comitiva e uma tropa para exigir que ele renunciasse. Mas era tarde demais,
suficientemente fortalecido pelos desgostos do povo da cidade inflingidos por
Magnus, Krampus finalmente se libertara e não havia exército mortal capaz de
detê-lo.
![]() |
O infantofóbico demônio Krampus finalmente dá as caras. |
Amarrado ao chão por horas, Klaus
estava prestes a morrer congelado como sua mãe, quando pediu a Lilli que
cantasse. O uivo entoado pela loba
invocou os espíritos do gelo e da floresta e eles decidiram que era hora de
fazer mais. Com o uso de três runas poderosas colocadas sobre o corpo frio de
Klaus, eles criaram um novo servo da magia profunda.
Krampus estava descontrolado,
destruindo tudo em seu caminho e desejo de devorar todas as crianças que
encontrasse, acusando-as de serem “Egoístas e gananciosas! Inchadas com doces e
balas!” . O monstro demoníaco a essa altura estava tão fora do controle de
Magnus que estava prestes a devorar Jonas, o próprio filho do Barão, quando foi
interrompido e atacado por Klaus, que ao lado de Lilli, conduzia um poderoso
trenó mágico puxado por lobos! Usando todos os seus recursos mágicos, Klaus e
Krampus batalharam. Quando o monstro estava para ser derrotado, Magnus interviu
atravessando Klaus com uma espada e dizendo ao demônio que era seu aliado e
portanto deveria receber seus favores e controla-lo. Krampus, no entanto, não
estava disposto a dividir poder e carbonizou Magnus vivo.
Dagmar tentou se defender sozinha da
criatura, mas logo percebeu que Klaus estava vivo e bem.
“Klaus? Eu vi ele atravessar você
com...” disse a Lady de Grimsvig assustada.
“Alguma coisa aconteceu comigo lá no
gelo. A família brilhante me levou até uma casa além das luzes do norte. Não
posso mais ser morto. Ainda não sei exatamente o que isso significa. Vamos ver”
respondeu Klaus a seu amor de infância partindo em seguida para cima de Krampus
e salvando Jonas após decapitar o demônio.
O Yuletime prometido foi festejado
com uma grande árvore de luzes. Lady Dagmar governou Gramsvig como Klaus como
seu conselheiro nos anos que se seguiram. O casal criou junto o jovem Jonas que
cresceu para se tornar um homem muito mais nobre e honrado que seu pai
biológico.
Quando Dagmar morreu de velhice,
Klaus decidiu que o Norte do mundo era muito pouco para um homem com seus
privilégios servir. Ele partiu para presentear crianças ao redor do planeta,
mas prometeu ao novo barão de Grimsvig, Jonas, voltar uma vez por ano “Quando
as noites forem longas e os dias ficarem frios. Quando precisarem de uma luz na
escuridão”.
Com personagens e enredo muito bem
estruturados e desenvolvidos por Grant Morrison e a arte narrativa maravilhosamente estupenda de Dan
Mora, Klaus me fez, pelo menos de uma certa maneira, acreditar em Papai Noel.
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